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EBA - Empresa Brasileira de Armazenamento, Redex e Operações Logísticas
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Em entrevista exclusiva para o Start da Semana, diretora-executiva de Reverse and Waste da companhia comentou regulamentações recentes da Lei 12.305, ressaltou a responsabilidade do governo e das grandes indústrias e disse ter boas expectativas para o futuro – mas não em curto prazo

Por Christian Presa


Executiva citou indústria de agrotóxicos e embalagens dos agroquímicos como referência em logística reversa (Foto: Divulgação)

Em 2010, a sanção da Lei 12.305 instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos no Brasil. De lá para cá, o tema tornou uma obrigatoriedade na gestão das empresas – ávidos por cumprirem os requisitos da agenda ESG – e destacou um processo que, nesse cenário, ganhou espaço cativo: a logística reversa.

No entanto, a simples menção à logística reversa faz surgir o primeiro questionamento: em que ponto está o Brasil? Há uma gestão de resíduos efetiva ou, apesar da lei já existir há 13 anos, ainda é preciso superar obstáculos? Se há desafios, quais são eles e de que maneira eles podem ser superados?

“O Brasil é muito grande. Então, o primeiro grande desafio sempre vai ser a parte territorial”, ressaltou a diretora-executiva de Reverse and Waste da Ambipar, Priscila Santos.

Em entrevista exclusiva para o “Start da Semana” da MundoLogística, ela também comentou regulamentações recentes da Lei 12.305, ressaltou a responsabilidade do governo e das grandes indústrias. Santos disse ter boas expectativas para o futuro – mas não em curto prazo.

Leia na íntegra!


MUNDOLOGÍSTICA: A agenda ESG está extremamente em alta nos últimos anos, o que certamente deu força às questões de logística reversa. Como esse assunto era tratado antes de o ESG estar em evidência?

PRISCILA SANTOS: A logística reversa vem com uma necessidade há muitos anos. É um pedido do setor ambiental, de gestores do meio ambiente e até mesmo por parte dos distribuidores e fabricantes que não sabiam como se posicionar na captação desse material. Por volta de 2005, começou um apelo muito forte, principalmente pela parte de resíduos contaminantes, de pilhas e baterias, tanto que, em 2008, houve uma normativa falando sobre logística reversa de pilhas e baterias. Antigamente, não se falava em área de meio ambiente, sustentabilidade e ESG, mas se falava em profissionais que estavam preocupados em reduzir custos das suas operações, em não ter uma concorrência do produto. Quando a gente fala em logística reversa, nem sempre estamos falando de materiais avariados, mas também de materiais que podem ser reparados e recondicionados. Então, isso acabava criando um problema de gestão interna. Eu diria que, a partir de 2008, com a inserção do Conama [Conselho Nacional do Meio Ambiente], e de 2008 a 2010 tivemos os grandes marcos, que foi quando se iniciou essa jornada da expressão “logística reversa” efetivamente. Quando veio a política e o decreto de regulamentação, acredito que se criou um nome e uma identidade para uma prática que já está sendo efetuada. Com isso, os profissionais das empresas se tornaram mais requisitados, foram construídos departamentos e até mesmo tendo o envolvimento com o sistema de logística. Nós já sabemos que a logística é a distribuição, a entrega etc., mas foi preciso entender onde está a reversa nisso, onde é possível otimizar custo e garantir mais rastreabilidade. Foi aí que houve esse “link” de grandes transportadoras e grandes modais para que a gente conseguisse aproveitar a logística deles, tanto do retorno do material avariado quanto do que o consumidor descartou, para que possamos investir em processos de sustentabilidade e projetos de manufatura reversa, tratamento e destinação.

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010) foi regulamentada em 2022, com algumas alterações notáveis como não exigência da submissão das embalagens de produtos destinados à exportação ao Sistema de Logística Reversa. Qual é o efeito prático dessa mudança?

Primeiro, nós assistimos muitas empresas surgindo com associações e instituições que focam exatamente em construir planos de logística reversas coletivos. Então, os sindicatos e as associações acabam abraçando esses institutos e empresas que detêm um plano coletivo para área de embalagens, independentemente de a origem ser uma indústria química, cosmética ou alimentícia, por exemplo. Ela acaba desenhando esse campo de como que será feita a captação das embalagens no mercado, certifica e cria um sistema de nota fiscal. Quando a gente se pergunta o que isso mudou para o nosso setor, a resposta é muito e pouco. Muito porque se evidenciou a necessidade de logística reversa como uma condicionante para se ter um sistema de importação e exportação funcionando, a exigência da validação desses planos junto aos órgãos regulamentadores, enfim… as empresas estão pensando sobre isso. A dificuldade é quando se trata de associações e institutos que não têm planos coletivos direcionados para grandes propósitos ou que sejam realmente factíveis. A Ambipar não é a favor da compra de crédito de logística reversa puramente. Nós gostamos de construir o plano e realmente ter o lastro e a rastreabilidade completa. Trabalhamos muito com cooperativas, literalmente com o B2C literalmente, para ter essa comunicação direta e a logística reversa seja efetuada. Então, a gente gosta de construir planos coletivos, mas de uma forma que envolva totalmente a parte do ESG, a questão social, que são materiais derivados de cooperativas padronizadas e pela própria Ambipar. É um trabalho social maravilhoso e gostamos muito de ver essa questão da comunicação, de incentivar a população sobre isso. Quando você volta toda essa cadeia, é possível perceber que, independente de como está funcionando, já existem muitas empresas pensando que, devido à regulamentação, são obrigadas a entenderem sobre logística reversa, a falarem sobre isso e pensar em modais para se transcrever na empresa.

Outras mudanças bem relevantes são a criação do Programa Nacional de Logística Reversa e a exigência do Manifesto de Transporte de Resíduos (MTR). Você acredita que essas são estratégias efetivas para regulamentar e fiscalizar processos?

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Não é suficiente, a meu ver. Há muitos gaps. Agora foram feitas correções no MTR na questão do pós-consumo com essas atualizações, mas não tinha se pensado nisso antes. Por exemplo: como uma pessoa física vai enviar para um determinado local e ter rastreabilidade? A emissão do MTR será de que forma? Não havia se pensado no MTR de logística reversa puramente. Agora, com essas atualizações, acredito que ficará muito mais fácil ter a garantia do começo, meio e fim e das volumetrias. E o que tem realmente auxiliado essas plataformas – seja o SINIR [Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos], o CETESB [Companhia Ambiental do Estado de São Paulo] ou o SIGOR [Sistema Estadual de Gerenciamento Online de Resíduos Sólidos] – é ter um documento oficial dentro de uma plataforma do órgão regulamentador no qual é obrigatório imputar até o 31 de março informações sobre coletas, processos e se as metas foram atingidas ou não. Acredito que isso é muito importante para fiscalizar e ter um banco de dados.

Você diria que existe algum setor que está mais preparado que o outro para realizar logística reversa? Por exemplo, que alguma cadeia seja referência nesse sentido? 

Acredito que, pelo tempo de constituição, a referencia é a logística reversa dos agrotóxicos e embalagens dos agroquímicos. É um aprendizado muito grande devido ao tempo que eles já iniciaram o projeto e, claro, a unificação do setor. Isso é muito importante. Quando a gente vê diversas indústrias com muitas associações, a dificuldade é maior, pois são linguagens, tratamentos, políticas e culturas diferentes. Agora, quando se fala de um setor que realmente abraçou, uniu-se em uma instituição única, entendeu as dificuldades do pequeno produtor e fez uma condicionante de venda atrelada à embalagem de reversa, é uma referência muito bacana. É um setor que deve ser usado como exemplo sempre. E o setor de pneus, também. Nós vemos cada vez menos pneus sendo largados em qualquer lugar exatamente porque a ANIP [Associação Nacional da Indústria de Pneumáticos] fez algo maravilhoso nesse sentido de homologação de parceiros logísticos, captação e recebimento sem custo. Ela conseguiu sustentar a logística reversa e a destinação com algo que todo mundo quer escutar: custo zero, tanto para o consumidor final quanto para pequenos geradores. Isso é impactante e os números estão aí para dizer. Temos muito que aprender com esses dois exemplos.

Em que ponto a logística reversa vai além da discussão sobre sustentabilidade?

A meu ver, a sustentabilidade é meio ambiente, é algo financeiramente viável e tem que ter um viés social. Isso, para mim, é sustentabilidade. Hoje, as pessoas traduzem sustentabilidade somente como se fosse um “eco-verde”. Na minha visão, particularmente, acredito que precisamos encarar a sustentabilidade com práticas que sejam financeiramente viáveis. Há muitas pessoas que têm processos maravilhosos, mas infelizmente, seja pela pulverização da capitação de material ou pela dificuldade de tratamento e custo envolvido, não consegue avançar. Mas, em contrapartida, se nós tivéssemos apoio institucional dos fabricantes e das associações, a gente conseguiria consolidar esses resíduos de uma forma muito melhor, atrelando valor para ele, tanto repassando para o consumidor final ou reduzindo custo com a destinação dos materiais, e você teria uma gama maior. Teríamos uma cadeia que consideraria questões desde a fabricação do produto, considerando o eco design dele. Não estaríamos pensando somente em beleza, mas em composição, reciclagem, distribuição e que o consumidor tende a receber com isso. Não precisa ser só valores financeiros, mas ele entenderia que o produto que está usando não prejudica o meio ambiente. Esse é o conceito ambiental na sustentabilidade. Só que quando eu desenvolvo toda essa cultura, desde o eco design até um processo de logística com carbono neutro, preocupação com o descarte e um tratamento viável, nós temos processos e resíduos sustentáveis. A conta se paga desde o início e com os envolvidos ativos.

Com a sustentabilidade em foco, vê-se muitas empresas comprometidas com o tema, mas também existe o greenwashing, caracterizado pelas iniciativas que servem para marketing, mas não se sustentam na prática. Como identificar essas práticas e, mais do que isso, evitar reproduzi-las?

No caso de pessoas que detêm algum conhecimento, boa vontade e iniciativas de preocupação com o meio ambiente, elas conseguem identificar um produto de uma maneira que, infelizmente, é mais visual. Por exemplo, as pessoas acham que usar um papel reciclado é melhor do que um papel branco, mesmo já sendo comprovado que o papel branco, em questões químicas, é menos poluente do que o papel reciclado. Só que é difícil para quem não tem o conhecimento. Há uma ilusão muito grande com a parte de Marketing. Então, para o consumidor que já tem a preocupação, ele provavelmente vai estudar sobre, com curiosidade para se conscientizar e entender um pouco mais. Agora, para aquele que não tem o tempo ou a curiosidade de se aprofundar, infelizmente fica muito difícil. Por isso que eu acredito que o governo tenha uma participação importante em exigir informações de uma forma grande na frente de algumas embalagens. Dados mais factíveis, de uma forma de uma leitura mais simplória. Por exemplo, a quantidade de água e energia elétrica consumidas na fabricação de um determinado material, ou a porcentagem de reciclagem de uma embalagem. Isso vai independer de a pessoa ter conhecimentos ambientais e de sustentabilidade. Ela vai ver números. Acredito que, independentemente de classes sociais, cultura e formação, esses dados são palpáveis para fazer esses comparativos de uma forma mais transparente.

Na sua visão, existe alguma questão de logística reversa que ainda não tem destaque suficiente e deveria ter mais atenção por parte do setor?

Quando a gente olha para distribuição de produtos, ainda não existe a prática de que o mesmo caminhão que está indo distribuir retorne com produtos, embalagens e resíduos. Existe um conceito que terão empresas dedicadas a essas operações, mas a logística em si não faz a reversa. São pouquíssimas empresas fazem a distribuição de cargas fracionadas, até porque todo mundo prefere uma carga fechada com origem e destino. Tanto que o Mercado Livre está aí para provar que ele mesmo montou a frota, mesmo com terceiros, e preferiu administrar essa logística de distribuição, pois as empresas não queriam fazer fracionado. Então, considerando essa dificuldade do setor, é como se a logística reversa fosse uma grande vilã. As empresas não querem colocar um resíduo ou uma embalagem vazia no caminhão limpo. Mas e se elas colocassem condições sobre esse resíduo e essa embalagem? Não seria algo sujo, mas simplesmente uma embalagem vazia. Haveria redução de custos e de emissões atmosféricas, mas isso infelizmente não é pensado. É algo que ainda é visto como tabu. Outro ponto da logística reversa é que ela é sempre pensada a partir do que as grandes indústrias precisam fazer, mas vejo que a comunicação com o consumidor final, a educação e a boa prática precisam ser divulgadas de forma sinérgica com as grandes empresas. Às vezes existem ações pontuais que, por não serem recorrentes, acabam deixando o consumidor confuso. A logística reversa tem que ser persistente e contínua. Se não, não tem razão de ser. Então eu acho que outro ponto da logística reversa falha muito é isso. São projetos descontinuados e sem a comunicação e envolvimento do consumidor final. Acho que é outro ponto que precisa ser olhado com carinho. Por mais que existam regulamentações e exigências legais para grandes empresas e corporações, qual que é a obrigação do consumidor final? Como que ele realmente vai sentir que isso é responsabilidade dele? É preciso “brigar” para que ele faça certo, mas ele também precisa ter apoio e recurso. 

São quase 13 anos da publicação da Lei 12.305 e você mesma diz que algumas ações trouxeram melhorias, mas ainda não são suficientes. Então, quais seriam os desafios que ainda é preciso enfrentar para que a logística reversa seja, de fato, efetiva no Brasil? 

O Brasil é muito grande. Hoje, nós temos locais em que, para chegar, é preciso pegar a rodovia e depois o barco ou atravessar de balsa. O custo disso é muito alto. Além disso, existem as questões de tratamento, pois não é todo local que pode ter uma indústria. Então, como você trabalha com áreas de transbordo? Também existe a parte cultural e de fiscalização sobre isso. Então, o primeiro grande desafio do Brasil sempre vai ser a parte territorial. Outro ponto é a questão cultural, a parte de fiscalização que dificulta muito, porque infelizmente a grande maioria das pessoas só faz algo se houver uma fiscalização que as obrigue a cumprir isso. Tem também questões de tecnologia. Quando nós falamos de Sul e Sudeste, estamos muito bem servidos, mas em outras regiões do país há grande dificuldade em destinar alguns resíduos. Mesmo estando aqui em São Paulo, por exemplo, não há tecnologia para tratamento de tudo que geramos. Por isso, infelizmente, muitas coisas ainda são enviadas para aterros, como as telhas de amianto. Então, são problemas que todos estão interligados, desde a origem até a destinação com a logística.

Com o início de uma nova gestão de Governo Federal e mudanças expressivas na pasta de Meio Ambiente, como você acredita que a pauta de logística reversa será abordada nos próximos anos?

Acredito que a nova política vai tender a fazer diferente do governo anterior, tentando dar mais atenção a essa pauta. Esperamos que essas políticas não sejam apenas aprovadas, mas sejam construídas e validadas com técnicos e pesquisa pública. Tivemos no dia 13 de fevereiro a assinatura de um decreto referente à parte de cooperativas que será bem impactante, com relação a créditos de logística reversa. É mais um incentivo que para fazer as coisas acontecerem, principalmente voltados aos catadores e às cooperativas. Agora, no modo geral, espero muito [que haja atenção para essa pauta], obviamente. Estou nessa área e é a profissão que escolhi. Mas vendo as situações com que nós estamos vivenciando agora como um geral, não sei se, pelo menos para 2023, teremos grandes mudanças ou grandes concretizações devido ao momento político, econômico e mundial em cenários gerais. Mas torço para que isso aconteça. Estamos com várias frentes de associações, até mesmo a própria indústria está imputando vários projetos de leis para serem aprovados, não para o bem próprio, mas para o bem comum e estão tendo apoio de feras no mercado, tanto como empresas como a Ambipar, como outras tantas empresas que colaboram. Acredito que, até em meados de 2024, a gente tem alterações grandiosas e melhorias positivas.

Fonte: Mundo Logística

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